sexta-feira, 13 de junho de 2014

Aprovação do PNE pode recolocar Brasilia na vanguarda da educação


Remi Castioni


A Câmara dos Deputados concluiu a votação do Plano Nacional de Educação - PNE (Projeto de Lei 8.035/2010). Foram 42 meses de tramitação desde que o projeto foi apresentado pelo presidente Lula em dezembro de 2010. O PNE com vigência para os próximos 10 anos será o primeiro plano fruto de uma Conferência Nacional de Educação com ampla participação da sociedade civil, realizada em março de 2010, em Brasília. As etapas preliminares da CONAE-2010, envolveram 400 mil delegados em conferências realizadas em 50% dos municípios brasileiros. É um grandioso esforço digno de comemoração agora com a aprovação do PNE.
O resultado desse empreendimento compreende o estabelecimento de 20 metas para a educação brasileira para todos os níveis e modalidades de educação, alocando o dobro de recursos até atingir 10% do PIB, o que equivaleria hoje a quase 500 bilhões de reais. Hoje aplicamos metade disso. O investimento seria ampliado com a melhor remuneração dos professores e funcionários, construção de escolas, equipamentos e material didático adequado. Há metas da creche a pós-graduação como a elevação do número de doutores, cuja meta é formar 25 mil anualmente. Hoje formamos metade disso. Pra se ter uma ideia da nossa defasagem em relação à média mundial na formação de doutores precisaríamos aumentar em 11% ao ano durante 28 anos para atingir a proporção média mundial que é de 200 doutores em cada 100 mil habitantes. Atualmente nossos programas de pós-graduação formam 10 doutores por cada 100 mil habitantes.
Esta boa notícia no plano nacional vem acompanhada de outra tão grandiosa quanto. Nos dias 27 e 28 de maio, a Conferência Distrital de Educação, aprovou o texto-base do primeiro Plano Distrital de Educação – PDE, que se aprovado pela Câmara Legislativa do Distrito Federal ainda neste ano, inaugurará os planos de educação da nova leva do PNE vigentes entre 2015 a 2024. A Constituição Federal e a LDB disciplinam que a União, os Estados e os Municípios elaborem os seus planos de educação.
A Conferência Distrital de Educação foi organizada pelo Fórum Distrital de Educação coordenado pela Secretaria de Educação do Distrito Federal e do qual fazem parte as instituições de ensino, os segmentos de professores e funcionários de escolas e universidades dos setores público e privado, além de estudantes, pais e representações da sociedade civil. A UnB está representada no Fórum pelo Decano de Graduação.
O Plano Distrital prevê metas ousadas para a educação infantil, particularmente, a creche, que tem baixa cobertura no Distrito Federal. A meta é passar dos atuais 4% de atendimento público para 40%. Isso impacta na construção de 200 creches, além das 112 que o governo local está construindo.
No ensino superior o objetivo é atingir uma taxa de escolarização bruta similar aos países desenvolvidos, de 60% da população. O DF é hoje a unidade federada que tem a melhor performance no ensino superior. Já atinge hoje as metas do próprio PNE para 2024. Para tanto, o plano prevê a ampliação de 20 mil vagas públicas, sendo 10 mil por parte da UnB e as demais 10 mil a partir da criação da Universidade Distrital e a transformação da Escola Superior em Ciências da Saúde - ESCS em UniSUS. Para a UnB, o Plano prevê a construção de um novo campus, na região do Paranoá-Itapoã.
O Plano de Educação do Distrito Federal foi construído nos moldes do PNE aprovado pela Câmara dos Deputados. Tem 21 metas e também, a exemplo do Plano Nacional, prevê dobrar os investimentos em educação passando dos atuais R$ 5 bilhões para R$ 10 bilhões, envolvendo os orçamentos federal e distrital alocados para a educação. Somente o sistema federal com a UnB e o IFB será responsável por de R$ 2 bilhões na manutenção e desenvolvimento do ensino.
O PDE prevê também a criação do Sistema Distrital de Educação. A ideia do sistema é dar organicidade a educação e atribuir as responsabilidades pela gestão da educação, além de prever a articulação do sistema local com o nacional.
Por que Brasilia pode estar na vanguarda dessa nova leva de Planos que vão surgir a partir da aprovação do PNE? Anisio Teixeira quando enviou ao Ministro da Educação, Clóvis Salgado da Gama, em 1960, seu relatório sobre o plano quinquenal do MEC (1956 – 1960) propunha no documento um lugar de destaque para Brasilia. Segundo ele, o plano visava oferecer à Nação “um conjunto de escolas que pudessem constituir exemplo e demonstração para o sistema educacional do país”. Infelizmente isso foi se perdendo nos sucessivos governos do regime militar e nos civis que tivemos na nossa capital, fazendo com que o Distrito Federal fosse hoje, a única unidade federada que ainda não tem plano de educação.
O Distrito Federal tem condições excepcionais de ser uma verdadeira cidade educativa. Já atingiu os mais baixos índices de analfabetismo, tem um território pequeno com poucas escolas, tem o corpo docente na educação básica com melhor formação do Brasil e remunera os seus profissionais da educação pagando três vezes mais a média do País. Sem falar na própria UnB, onde 90% do nosso corpo docente é formado por doutores. Falta ao DF um plano que dê organicidade a educação e isso vai ser alcançado com o PNE e o PDE.
Muitas das questões pensadas por nós educadores de hoje como salvação para a educação brasileira já tinham sido perseguidas por aqueles que nos antecederam. Entre eles, não tenho dúvidas em afirmar que Anísio Teixeira foi o mais arguto. Depois de ter se envolvido, a pedido de Juscelino Kubitschek, no plano de educação da nova capital, esteve presente em tudo o que ocorreu na educação brasileira até o golpe de 1964. Envolveu-se durante o governo Jango na aprovação da LDB, de 1961 e depois na aprovação do PNE, de 1962, que ele próprio elaborou, além de ter sido ao mesmo tempo diretor da CAPES, do INEP e reitor da UnB.
Em um documento inédito localizado recentemente pelo professor João Rocha (UFBA) em uma das salas da Escola Polítécnica da Bahia, sala esta que era ocupada pelo Prof. Hildérico Pinheiro de Oliveira, uma espécie de “Lelé” da educação, pois fora responsável pelo serviço nacional de construções escolares, Anísio listava em 1962, os oito pontos que com a aprovação da LDB e do PNE iriam revolucionar a educação brasileira. Entre estes estava à destinação de recursos baseado no custo do aluno, que foi uma das polêmicas da aprovação do PNE nesta semana, em pleno plenário da Câmara dos Deputados. Ou seja, há 52 anos, Anísio Teixeira, já antevia o que para nós hoje aparece como descoberta, a alocação de recursos baseada no custo do aluno, hoje anunciado como Custo Aluno Qualidade - CAQ. 
Por fim. Transcrevo aqui o que era o sonho de Anísio Teixeira depois de concluir os marcos da reforma educacional proposto pelas reformas de base de Jango. No texto inédito ele conclui: “O Brasil tem de realizar as três tarefas nestas próximas décadas do século XX. É uma corrida entre elas e a sobrevivência. Não estamos reunidos para um debate acadêmico, mas para o planejamento de uma batalha. Não há batalha sem planos. O nosso plano é uma série de decisões sobre a estratégia e a tática dessas batalhas. Possamos fazê-la e vencê-la”.
Esta batalha foi adiada em 50 anos. Será nossa última oportunidade. Em 50 anos seremos não mais um país de jovens, mas de velhos. Muitas das nossas escolas já não serão mais escolas. Serão asilos. É vencer ou vencer! A batalha!
Remi  Castioni é professor da UnB.

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